domingo, agosto 28, 2011

ATIRE O PAU NO GATO, EM VEZ DE ATIRAR NO PRÓPRIO PÉ



Esta semana vi uma pedagoga repreendendo um estagiário que cantava com criancinhas do pré a música  “Atirei o pau no gato”.  Segundo ela, que se dirigiu cheia de delicadeza  ao estudante em estágio , seria mais interessante cantar “Não atire o pau no gato”.  E entoou, no mesmo ritmo, uma versão politicamente correta da referida cantiga infantil: “Não atire o pau no gato... to/ por que isso... so/ não se faz... faz... faz/ o gatinho...  nho é nosso amigo... go/ não devemos maltratar os animais”.  Fiquei assistindo à cena: o estagiário ouviu atento a orientação pedagógica e, logo após, incitou a criançada a repetir com ele a versão politicamente correta da cantiga infantil.  Sentindo-se atendida, a pedagoga retirou-se satisfeita com sua intervenção revolucionária.
Nada contra a escola ensinar a criançada a não maltratar os bichinhos, entretanto fiquei pensando em por que não existe uma música “Atirei o pau no cachorro”? Afinal, cachorros são tão presentes na vida da meninada quanto gatos. Em busca de resposta, meu raciocínio mergulhou em  uma divagação de ordem semântica a respeito de gatos e cachorros que esbarrou na seguinte conclusão: cachorros são domésticos e gatos domesticados.
Se a explicação para minha pergunta está no fato de cães serem domésticos e gatos domesticados, qual a diferença entre doméstico e domesticado? Diria que domesticado é o animal independente, com o grosso dos instintos preservados, porém adaptado ao convívio humano; e doméstico é aquele bicho que já não consegue sobreviver sem a presença humana. Cachorros não raro morrem de fome e sede se o dono não os alimentar. Cachorros são domésticos. Gatos se viram. Saem à caça se lhes faltar ração ou água. Seguindo por esse caminho, no feixe de sentidos do termo doméstico diria que há o sema “mais dependente” e todas as convergências de sentido advindos de sua presença ao passo que em domesticado há o sema distintivo “mais independente” igualmente amarrado a uma trama de sentidos específicos . Tendo em vista tais especificidades posso dizer que gatos, no que tange à preservação dos instintos, geralmente são mais selvagens do que cachorros, portanto mais imprevisíveis.
Se gatos são mais presos às fronteiras de socialidade de suas origens é natural pensar que em algum momento eles poderão comportar-se de forma perigosa no ambiente doméstico, expondo a risco a integridade física de crianças que ainda não têm noção dos limites das relações com animais caseiros. Assim, não fica difícil imaginar porque a sabedoria popular investiu na criação da musiquinha “Atirei o pau no gato”. Desde cedo é bom que criancinhas saibam manter distância de um bicho que não vai entender, como os cães costumam entender, certas brincadeiras fora das proporções protagonizadas pela criançada.
Olhando por esse ângulo, o “Não atire o pau no gato”, com toda a simpatia preservacionista que encerra,  ignora um saber do povo cuja finalidade é educar a criança para um distanciamento preventivo de um animal que bem poderá  ferir-lhe a qualquer momento. Há braços!

Um comentário:

Luana Paula disse...

Realmente e um estudo bastante inteesante este que vc realizou prof:Alan.Mas animais como gatos se tratados com carinho e acostumado com crianças muitas vezes são menos agrecivéis que muitos cães.