domingo, maio 08, 2011

O MUNDO MAL PASSADO NO CALOR DOS MEGAPIXELS, GIGABYTES E TERABYTES



“Com a ‘velocidade instantânea’, as causas das coisas vieram novamente à tona da consciência, o que não ocorria com as coisas em sequência e em consequente concatenação. Em lugar de perguntar o que veio primeiro, o ovo ou a galinha, começou-se a desconfiar que a galinha foi ideia do ovo para a produção de mais ovos”. (Marshall Mcluhan, Os meios de comunicação como extensão do homem)

Vivemos mais do que nunca na era da comunicação e a velocidade com que enviamos e recebemos mensagens é assustadora. A rede mundial acessível por computadores e telefones móveis possibilita-nos manifestar as mais inesperadas e variadas opiniões uma vez que podemos estar inseridos num acontecimento e ao mesmo tempo digitando em nosso smartphone nossas impressões, a todo momento espalhando-as via Twitter, Facebook, Orkut e demais redes sociais ou campos de interação na internet. O gerenciamento da informação e da comunicação torna-se assim o campo que exige maior atenção e cuidado.
A maioria das pessoas ainda não sabe muito bem como gerenciar comunicação e informação em tempo real. Há nisso alguns problemas. O primeiro está, em outras palavras, no que o pensador canadense Mcluhan denuncia na epígrafe acima: com a velocidade e a concomitância, nós que fomos treinados anos a fio dentro de um modus operandi que alinha os acontecimentos em sequência e num encadeamento previamente esterilizado para evitar ruídos ideológicos indesejáveis, nos vemos perdidos no universo de abundância informacional acessível a todos os sentidos, de igual descartabilidade, que a alta tecnologia passou a permitir em todos os campos, sobretudo no das comunicações.
Quem acompanhou a recente cobertura da operação da marinha americana que culminou na morte do líder da Al Qaeda, Osama Bin Laden, assistida em tempo real pela cúpula da Casa Branca, como se fosse um filme de guerra daqueles protagonizados por Sylvester Stallone, pôde notar quantas vezes as informações foram ditas e desditas em um mesmo dia. Ocorre que a vida real, o acontecer não segue necessariamente nosso treinamento mental para ajustar o que se materializa diante de nossos sentidos em uma sequência linear e lógica. Testemunhar algo no momento em que está acontecendo e de imediato transformar a movimentação da realidade em informação geral, apropriada ao consumo de todas as pessoas do planeta, quando estas ou testemunharam em tempo real, por meio de seus equipamentos de mídia, o mesmo evento ou o resgataram em algum vídeo do You Tube não é algo simples. O dizer e desdizer praticado pelo governo americano, com respeito à morte de Bin Laden, é exemplo de tal complexidade. Como ajustar as informações sobre o acontecimento a uma linha de pensamento favorável aos interesses de Washington perante a comunidade mundial e local?
Mais uma vez relendo Marshall Mcluhan, o mesmo que em 1964 anteviu que a evolução tecnológica iria transformar o mundo em uma aldeia global, poderíamos dizer que a rede mundial de informação e comunicação chamada de internet é um espaço de alta temperatura. Mcluhan dizia ser um meio quente aquele com excesso de informação, saturado. A internet encarna perfeitamente esse raciocínio, pois atinge temperaturas tão altas diariamente que de acontecimentos explosivos alçados ao seu forno pela manhã às vezes só restam cinzas no final da tarde.  Basta aparecer um assunto polêmico ou inusitado, todo mundo quer lançar uma achazinha na fogueira. E o volume de impressões e imprecisões faz crescer ao redor do assunto uma miríade de imagens, montagens audiovisuais, mitos e teorias, algumas totalmente absurdas que persistem e se fixam como se fossem verdades absolutas.
Outro problema é que cada vez mais as pessoas de posse das tecnologias e expostas a elas enrolam-se com a publicação de informações mal expressas que acabam causando na rede uma reação contrária à esperada. Muitas vezes as intervenções individuais são traídas por memórias de ideologias nefastas e o resultado é a proliferação em rede do linchamento simbólico de tal indivíduo, invariavelmente sem o letramento necessário para filtrar informações e policiar seus modos de expressão. Há abundância de exemplos a esse respeito. O caso mais recente foi o do vereador de Anápolis que solicitou ao presidente da câmara um minuto de silêncio em respeito à morte do, como ele disse, “companheiro Bin Laden”. As imagens do vereador em ação espalharam-se pelo mundo negativamente, mas não menos feio fez o presidente da câmara que autorizou o pedido: ao ser questionado sobre o ocorrido, afirmou que cometeu um ato falho. Não precisa ser freudiano para saber que um ato falho é a manifestação de um desejo reprimido. O presidente quis dizer então que, no seu íntimo, desejava também homenagear Bin Laden?
O gerenciamento de informações e comunicação torna-se desse modo algo que não pode ser negligenciado. Em um mundo monitorado incessantemente por câmeras de celulares, gravadores minúsculos embutidos nos mais variados objetos de uso cotidiano, adequar o que se diz e faz à pluralidade de auditórios é um desafio. O dizer e desdizer, reformular e readequar, ensaiar, ensaiar, ensaiar, deixa de ser algo restrito ao exercício solitário de escritores, jornalistas e atores para constituir uma exigência a qualquer pessoa que queira destacar-se e influenciar no movimento do desejo humano, o que pelo visto é anseio geral.
Há, desse modo, que se retomar a preocupação com a Retórica não apenas no que tange ao seu aspecto epidíctico, mas no seu aspecto argumentativo e persuasivo. O novo momento permeado e, de certa forma, dirigido pelo avanço e massificação dos aparatos tecnológicos de comunicação presume essa necessidade. A educação formal, é evidente, ainda não está preparada para essa tarefa. Como explicava há bastante tempo Marshall Mcluhan, a quem homenageamos com este texto, em seu livro Revolução na Comunicação: "Em nossas cidades, a maior parte da aprendizagem ocorre fora da sala de aula. A quantidade de informações transmitidas pela imprensa excede, de longe, a quantidade de informações transmitidas pela instrução e textos escolares".
        Devemos começar nossa tarefa de integração total aos novos tempos levando o que está fora da sala de aula para seu interior, como forma de exercitar o pensamento crítico e de elaborar instrumentos sólidos que permitam ao futuro cidadão interagir no mundo de modo mais independente e construtivo. É pertinente que nos dias atuais as crianças e jovens saiam da escola sabendo como administrar informações, ou seja, como materializá-las de modo a atender aos propósitos oriundos do universo de seus desejos e como filtrá-las quando vinda de outros universos. Adquirir domínio sobre o gerenciamento de informações redunda em domínio de comunicação.  A fornalha da rede mundial que consome boas reputações e funde falsos ídolos também pode ser hegemonicamente aquela que assa os melhores pães para saciar o desejo da humanidade.    
 Prof. Alan Oliveira Machado, maio 2011.

2 comentários:

Juca Alencar disse...

É importante levar para dentro da sala de aula, determinados assuntos. As pessoas saem das escolas e encontram um mundo complexo, e como não são preparadas não conseguem traçar seu caminho de forma independente e construtiva. Outro ponto importante, e tem que ser abordado na sala de aula, o mais rápido possível, é a educação financeira. É importante desde cedo ter uma consciência financeira e saber o valor do dinheiro no tempo.
Muito Bom esse assunto!

Anônimo disse...

Tem razão, acho que noções de contabilidade e de administração são também fundamentais para a formação das pessoas.