segunda-feira, março 28, 2011

RETÓRICA, ETHOS E PATHOS: QUE IMAGEM VOCÊ TEM?


De modo genérico e num sentido positivo, Tereza Halliday (1990, p. 08) define a retórica como “um tipo de comunicação para levar alguém, sem o uso da força, a aceitar uma ideia”. Podemos concluir ainda das afirmações dessa autora que uma democracia se delineia por meio do convívio e do entrelaçamento de várias retóricas, ou seja, das “várias maneiras de descrever, explicar e justificar as coisas, buscando o entendimento entre as pessoas que podem concordar ou não com o que lhes é descrito ou explicado”(idem).
O fato de vivermos em uma democracia nos torna, desse modo, seres retóricos, já que esse regime político privilegia o diálogo e o acordo em detrimento do uso da força bruta e da imposição. Mesmo reconhecendo que nas sociedades democráticas persistem, embora em menor escala, o uso da força e da imposição, essas atitudes amiúde são recebidas com reprovação pela sociedade e condenadas como ações negativas ao bom convívio social.
Ao pensarmos pelo ângulo da retórica, por ser o homem social, qualquer manifestação de alguém ou de quem quer que seja, encontra um público, ou conforme a retórica, um auditório. Estando essa manifestação e esse auditório situados em determinado momento histórico, em dadas circunstâncias, ver-se-á então, seguindo Maingueneau (2005, p.98), a instauração de uma imagem a respeito daquele que se manifestou, ou pela forma como produziu o seu discurso1, pela sua compleição física; ou pelos recursos de que fez uso, tais como os gestos, as entonações vocais, o modo como está vestido, o texto escrito etc. A esse respeito, bem antes de Maingueneau já se posicionam Perelman & Olbrechts-Tyteca (2005, p.23) quando, ao refletirem sobre a construção do orador, afirmam que “O estudo dos auditórios poderia igualmente constituir um capítulo de sociologia, pois, mais do que seu caráter pessoal, as opiniões de um homem dependem de seu meio social, de seu círculo, das pessoas que frequenta e com quem convive”.
A essa delicada relação entre aquele que enuncia (orador/locutor) e aquele para quem se enuncia (auditório/interlocutor) a retórica, desde Aristóteles, atribui respectivamente os nomes de ethos e páthos. Rememorando Aristóteles, Dascal (In: AMOSSY, 2005, p. 57) define ethos como o “caráter apropriado a cada tipo de discurso que o orador deve se preocupar em projetar”; e pathos como o “conjunto de emoções que o orador tenta suscitar em seu auditório”. Segundo vimos com Maingueneau e Perelman & Olbrechts-Titeca o conceito de ethos ganha mais complexidade na medida em que considera disposições sociais como a influência do meio etc.
Seguindo esse raciocínio, podemos concordar que ethos e páthos se constroem mutuamente, ou seja, na medida em que o locutor busca construir uma imagem, ele automaticamente cria um páthos, uma vez que no processo de construção do ethos entram informações prévias imaginárias ou não que o orador/locutor guarda a respeito do seu auditório/interlocutor.
Perelman & Olbrechts-Titeca (2005, p. 22), ao tratarem da construção do auditório como construção do orador dizem que “O auditório presumido é sempre, para quem argumenta, uma construção mais ou menos sistematizada. (...) o importante, para quem se propõe persuadir efetivamente indivíduos concretos, é que a construção não seja inadequada à experiência”. Assim, tendo em vista que, de certa forma, o orador/locutor engendra um auditório/interlocutor e este, por sua vez engendra uma imagem do orador/locutor, podemos dizer que o ethos é produto de um jogo de imagens que, para se firmar enquanto tal, necessita de uma sistematização adequada à experiência. O exímio orador, o escritor persuasivo é, dessa forma, aquele que, atuando com certa perícia no auditório, consegue conduzir as paixões deste a um encontro mais ou menos harmônico com as razões do orador, de modo que os sentidos se unifiquem. Conforme Maingueneau (idem), no que tange ao texto escrito, isso ocorre porque o leitor tende a construir a figura do fiador a quem ele deve o texto, “ a partir de indícios textuais de diversas ordens” a quem ele atribuirá “um caráter e uma corporalidade, cujo grau de precisão varia segundo os textos”.
Alan Oliveira Machado

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