domingo, maio 11, 2008

MENINA OFERECIDA

Para Nemi e Lobeira

Na Canabrava tem uma menina bandoleira que vive na boca do povo. Já até botaram apelido nela: uns a chamam de Fubuia, outros de Birita e Pinga, mas a brejeira detesta esses apelidos e prefere ser chamada formalmente de Cachaça, seu nome de batismo.
– Mais respeito, seu bando de pé-inchado! – assim provoca com os sujeitos que vivem de boteco em boteco espalhando que estão comendo Cachaça.
– Por que vocês não vão trabalhar? – arremata, com um suspeito moralismo indignado. Cachaça se irrita com a permissividade dos freqüentadores de bar que se metem a difamá-la, mas na verdade ela é muito fuleira, vive escanchada em balcão, não sai da praça, não perde velório nem festa e quando já tá bem concentrada, dana a falar bestagem:
- Ontem, o dono do bar enfiou uma raiz todinha em mim e eu achei foi bom, chega fiquei macia! – diz ela, mais metida do que rainha do milho em festa de São João.
O povo anda de saco cheio de Cachaça, mas a danada, sem um pingo de vergonha na cara, insiste em se oferecer para homens casados, rapazes, mulheres e até crianças. Cachaça pensa que Uibaí é Sodoma e Gomorra pra ela bancar toda essa esculhambação. Na verdade, Cachaça merece é ser chamada mesmo de Fofa Olho, de Venenosa, pois é uma diaba malvada, que não vale uma rapadura, uma cana roxa. A dita cuja é amante da vadiagem e se compraz em ver todo mundo ir ter com ela na alcova, na taberna, no brega ou em qualquer lugar. Prova disso é que pegaram Tarcísio Potão, em plena manhã de segunda-feira, comendo a ordinária na calçada de Fulosina. Neto Velho, o povo fala que nutria paixão violenta pela ingrata e acabou abandonado, curtindo uma doença passada por ela. As mulheres, enciumadas, botaram até apelido nos homens que andam atrás dessa desnaturada. Quando passam em frente a algum bar, vão logo desabafando:
- Lá estão os cachaceiros procurando a perdição!
- Essa bicha é perigosa... Tem o coração de pedra! – esse foi o recado de amante inveterado deixado por Quinca Galha. Que o diga Lobeira, um dos que volta e meia agarram ela à força e passam um mês comendo. Diria o mesmo, Ari, que escapou das garras da bicha, depois de algumas desilusões ou Carlinhos, se não tivesse sido assassinado pelos golpes do sufocante amor dessa roceira. Mas entra geração, sai geração, essa Lílith desvairada, embora já não tenha tanta moral, acaba fazendo algumas vítimas. O problema é que a danada tem fã-clube em toda parte, inclusive em Brasília, que não a deixa cair no ostracismo. Com freqüência desce a Uibaí o comboio de apreciadores da malvada, doido para comê-la. A barafunda é da pesada: tem neguim que come a maldita em fundo de boteco, em beira de baixão, em cima da serra e outros, ainda, fazem até grupo para traçar a treiteira. Fiquei sabendo inclusive que essa gente tem uma tara muito estranha: eles andam comendo ela com farinha! Há braços! (alan, em maio de 2005)

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