terça-feira, dezembro 11, 2007

A EXTINÇÃO DOS ESQUERDOSSAUROS

Alan Oliveira Machado

“A pobreza da experiência não é expressão de uma carência, mas antes a expressão de uma arrogância, a arrogância de não se querer ver e muito menos valorizar a experiência que nos cerca, apenas porque está fora da razão com que a podemos identificar e valorizar.” (Boaventura Sousa Santos, 2006)


Não se trata necessariamente de voltar à esquerda. Voltar à esquerda, simplesmente, pode nos levar a entender que os métodos da esquerda sempre foram os melhores e sempre serão e que o retorno seria uma espécie de exorcismo para expulsar demônios capitalistas do corpo, o que não é verdadeiro. É preciso que se retorne à origem, não para ser autêntico ou puro, não para reproduzir a monocultura do saber, mas para se reposicionar na atualidade, de forma crítica e coerente, dentro de um campo de pensamento e prática de esquerda que se constrói cotidianamente na leitura e releitura das práticas e demandas que a contemporaneidade produz, sem necessitar de repetir fórmulas e práticas que já não se ajustam à realidade das lutas.

Sabemos que não é nada fácil se localizar dentro da esquerda sem cair numa lógica que está na base de todo o pensamento ocidental moderno, qual seja a mania de linearizar o tempo e a história e dicotomizar as relações. Esse vício mental funciona como uma rede que só captura o que é compatível com sua trama. É como se fôssemos pescadores que utilizassem uma rede de buracos muito grandes de forma que só conseguíssemos pescar tubarões, levando-nos a crer que no mar só existem tubarões, apagando, portanto, toda a diversidade. Assim funciona essa maneira de entender a realidade, como diria o sociólogo português Boaventura Sousa Santos, a reboque de uma razão metonímica, ou seja, que reduz o todo à parte, que reduz a realidade tão somente ao que conseguimos prender em nossa razão.

Em sua complexidade, historicamente, esquerda e direita são campos de interesses não muito bem demarcados, porque, erroneamente, demarcamos esses espaços por meio de estereótipos (há algo mais superficial?). No dia a dia, pessoas que se situam na esquerda desenvolvem novas práticas revolucionárias, fora da lógica linear e maniqueísta da esquerda e isso irrita e gera ódio, sobretudo nos esquerdossauros, naqueles que seguem apenas os estereótipos (aqui, esquerdossauro não é uma questão de idade, mas de mentalidade). Ou o militante se enquadra no perfil imaginário estereotipado, ou é rechaçado. Como se a vida e a realidade social tivessem dois lados fixos, um lá e outro cá e as pessoas se não estão cá inquestionavelmente estão lá. Nos anos sessenta muitos esquerdistas criativos foram tachados de reacionários e pelegos, em nome dessa compreensão redutora e equivocada, no que diz respeito ao que deveria ser o comportamento do esquerdista.

O que esses esquerdossauros não entendem é que o que se faz e se diz tem contexto e é preciso entender esse contexto antes de mobilizar a rede redutora, se é que precisamos de rede redutora. Como entender o movimento da realidade se recusando a enfrentá-la no seu movimento complexo? Os critérios superficiais para se decidir se alguém ou algum movimento é de esquerda ou direita são ridículos, não se sustentam na dinâmica da realidade, levando os esquerdossauros, feito alguns evangélicos, a se fecharem em um mundinho esquizofrênico e paupérrimo em quase todos os sentidos. Enfim, para combater a falsa esquerda, meus camaradas, não é preciso virar um fóssil vagando cegamente na tempestade cotidiana ou um membro de grupelho encolhido sob o guarda-chuva da mediocridade. HÁ BRAÇOS! (5-10-07)

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